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JAMES STIRLING: Um estudo Biográfico





1 INTRODUÇÃO

Nascido na Escócia em 1926, Sir James Frazer Stirling passou a maior parte de sua vida na Inglaterra, até sua morte em 1992, aos 66 anos, algumas semanas após ser condecorado Cavaleiro pela Rainha Elisabeth II do Reino Unido (VIDLER, 2010).
Se formou em Arquitetura pela Universidade de Liverpool em 1949, foi aluno do arquiteto e historiador Colin Rowe nesse período e entre 1950 e 1952 completou sua formação acadêmica com a pós-graduação na School of Town Planning and Regional Research (em tradução livre: Escola de Planejamento Urbano e Pesquisa Regional de Londres em 1952 (VIDLER,2010).

Em 1981, Stirling foi o 3º arquiteto que recebeu o prêmio Pritzker - Premiação internacional e anual que concede honrarias ao arquiteto que, em seu trabalho construído, “demonstra talento, visão e comprometimento” (HYATT FOUNDATION, 2018). Quatro anos depois de seu falecimento, a premiação do RIBA recebe seu nome: “RIBA Stirling Prize”, elegendo projetos rigorosamente julgados no Reino Unido, com critérios como “inovação e originalidade, capacidade de estimular, envolver e encantar ocupantes e visitantes, acessibilidade e sustentabilidade” (RIBA, 2017).

Segundo Rafael Moneo (2008), a obra de Stirling pode ser considerada como um registro do ciclo histórico recente da Arquitetura por apresentar trabalhos que ilustram a segunda metade do século XX e, por essa razão, considera-o cronologicamente o primeiro arquiteto contemporâneo.

No desenvolvimento de sua obra e carreira, James Stirling passou por processos metodológicos que o levaram ao estilo pós-moderno e mesmo que em seu período ele tenha despertado interesse por seus projetos e estudos, foi considerado por alguns críticos como um arquiteto moderno incompetente, pelo menos até que o “pós-moderno” fosse reconhecido em seu trabalho. (MONEO, 2008).

No contexto dos anos 50, em que ele se formou, o Movimento Moderno ainda influenciava as escolas inglesas de Arquitetura, as inspirações de Le Corbusier nascem em Stirling nesse período e o acompanham em toda sua obra, esse flerte com o Moderno pode ser explicado pela presença de Colin Rowe em sua formação acadêmica, assim como o cenário de Liverpool em que Stirling cresceu, com a arquitetura industrial do final do século XIX é o que evidencia a inspiração brutalista de sua obra (TIETZ, 2008).




2 VIDA E OBRA
2.2 Primeira Fase



Recém-formado, um dos primeiros projetos de Stirling é a “Casa Core and Crosswall” de 1951, que não chegou a ser construída, apresenta a influência Corbusiana carregada em sua formação e demonstra em seus elementos o pensamento moderno por sua preocupação com o traçado formal e proporcional e a volumetria destacada que seria, então, o mote de seus projetos em toda sua carreira (MONEO, 2008).

No mesmo ano ele realizou um estudo da Maison Dom-ino de Le Corbusier, fazendo uma versão da Casa usando os mesmos materiais pré-fabricados, porém com uma geometria centralizada e dessa forma ele propõe uma estrutura nuclear, assim pode encaixar outras unidades iguais a essa e com o mesmo princípio Corbusiano de planta livre criar um edifício mais complexo. Esse estudo foi importante para ele começar a se questionar sobre como a popularização da Arquitetura Moderna ocasionou uma fatídica banalização do estilo (FAZIO; MOFFET; WODEHOUSE, 2011).



Partindo desse princípio, em 1953, Stirling faz o projeto da Universidade de Sheffield sem usar o conceito de Promenade Architeturale, que a ideia de “Caminhada Arquitetônica”, uma teoria de Le Corbusier em que todas as entradas, caminhos, halls de entrada, enfim espaços de acesso não podem ser estáticos ou óbvios. Nesse projeto, ele cumpre o programa arquitetônico e o resultado é a soma dos volumes em si, Rafael Moneo (2008) classifica isso como “tradução da Arquitetura Abstrata” e “Arquitetura como sintaxe”, ou seja, a simples conexão dos ambientes com a mesma linguagem.




Após esse período, Stirling ainda realizou alguns projetos relevantes, principalmente para a crítica do Movimento Moderno que começou a desenvolver e em 1956 ele se associa ao arquiteto James Gowan e jutos eles começam a participar de alguns concursos de arquitetura, principalmente para edifícios institucionais (FAZIO; MOFFET; WODEHOUSE, 2011).



Dessa época em diante surgiram os trabalhos mais importantes de Stirling, dentro do estilo brutalista: a Escola de Engenharia da Universidade de Leicester (1959 - 1963), a Faculdade de História da Universidade de Cambridge (1964 -1967) e o Florey Building ou Queen’s College na cidade de Oxford (1966 - 1971). Esses três projetos são conhecidos como “Trilogia Vermelha”, pelo fato de que o trio foi construído com o mesmo tipo de fechamento em tijolo vermelho, dando a coloração marcante para os projetos (WINTANLEY, 2012).

O primeiro deles, a Escola de Engenharia, o projeto foi feito entre 1959 e 1963 e é um dos principais projetos porque ao planejá-lo, Segundo Wintanley (2012) Stirling se inspirou nos galpões industriais do século XIX muito presentes no cenário de Liverpool, que é a cidade em que ele viveu na infância e se formou. Além disso, ele aplicou técnicas e materiais tecnológicos para época, o que mostra a influência de Louis Khan em sua obra.



O segundo projeto, é a Faculdade de História e assim como afirma Wintanley (2012), esse projeto ficou famoso por causa da cúpula que cobre toda a área de leitura da biblioteca do prédio e, por causa de toda a extensão da cobertura de vidro, a qualidade ambiental no interior do edifício é questionável nos verões, mesmo que excelente iluminação esteja presente.




O terceiro e último da “Trilogia Vermelha”, é o edifício que abriga uma das maiores residências estudantis do mundo, serve de moradia para estudantes universitários da cidade de Oxford. Esse edifício, diferente dos outros, surge com uma planta linear em formato de “U”, a intenção era que essa parte interna do “U” se tornasse uma versão moderna dos pátios de colégios tradicionais (FRACALOSSI, 2013).



A estrutura principal do edifício fica evidente nos pilotis, que possuem formato de pórtico de concreto armado, formados por dois pilares inclinados e a viga unindo-os, o edifício “descansa” sobre essa estrutura que é mais larga que o edifício. Alguns problemas de projeto surgiram para o Stirling, por causa da inclinação que ele fez questão de deixar, para demarcar a fachada interna do edifício, assim ele teve que “sacrificar” a fachada externa, pois as duas não possuem a mesma linguagem (FRACALOSSI, 2013).



2.2 Segunda fase



Entrando no período pós-moderno do arquiteto, em 1971 ele se une ao arquiteto Michael Wilford e os dois ficaram juntos até 92, quando Stirling falece (FAZIO, 2011). Dessa fase é possível observar dois projetos relevantes: a Neue Staatsgalerie (1984 - Nova Galeria do Estado em tradução livre) e o Number One Poultry (1985 – 1997 post mortem).

O primeiro deles, a Staatsgalerie, é a ampliação de um museu na Alemanha, que foi selecionado através de um concurso promovido pelo estado alemão (BRITTO, 2012). É um projeto importante nessa nova fase do Stirling, porque reúne um conjunto de estilos que ele se inspirou para o projeto, mencionando vários momentos históricos da Arquitetura de uma forma que o edifício não fique estático no tempo ou em um único estilo. Segundo Moneo (2008) “é um edifício que não possibilita o descanso do olhar”, porque em cada parte que você olhar terá um detalhe diferente.

Stirling usou materiais clássicos como as pedras de arenito e de travertino, misturadas com materiais modernos, como o aço industrial e o vidro. Todo o edifício é colorido e as cores demonstram a função dos ambientes (BRITTO, 2012). O projeto incorporou a declividade do terreno bastante acentuada, Stirling encarou isso mais como uma oportunidade de criar diferentes níveis de observação do museu do que como barreira projetual (KROLL, 2011).

Essa disposição em formato de “U” deixa claro que a intensão era formar uma organização tradicional e trazer a contradição da estética contemporânea (MONEO, 2008). O edifício é margeado por uma rodovia e uma avenida importante da cidade, e, ao visualizar externamente, percebe-se a continuidade linear da paisagem, com o contraste entre cores das pedras e os frisos da construção antiga ajudam a perceber uma passagem temporal para outra edificação (KROLL, 2011).



Para encerrar a breve análise entre os projetos mais importantes de Sir James Stirling, é possível citar o edifício mais icônico da Arquitetura pós-moderna do arquiteto: Number One Poultry, projetado em 1985 por ele e Wilford, mas que só foi concluído em 1997 (post mortem) é o edifício comercial com centenas de escritórios que quase foi descaracterizado em um retrofit que aconteceu em 2012 (WINTANLEY, 2012).




Por ser o último projeto e o mais diferente de todos os outros citados, Stirling deixou a sensação de que viriam projetos tão mirabolantes quanto este e a interrupção da carreira dele deixou esse hiato arquitetônico em sua obra (WINTANLEY, 2012).

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Stirling é considerado o arquiteto que vivenciou profundamente em sua própria obra o maior número de passagens históricas da Arquitetura (PEREIRA, 2010), sendo por essa razão considerado brilhante e muito inovador. O fato que que hoje ele não desperte tanto interesse por sua obra quanto em sua época é compreensível, uma vez que esta não possua uma linearidade estilística única e seja de difícil compreensão.

Suas premiações o tornaram memorável e a eloquência em seus projetos se tornaram, na visão de Rafael Moneo (2008), o pano de fundo para compreender a evolução arquitetônica de outros profissionais. É inegável que sua morte precoce aos 66 anos tenha deixado uma lacuna em sua breve passagem pela arquitetura pós-moderna, mesmo que esta tenha sido significante por suas contribuições.

É possível ainda pontuar a metodologia trabalhada por Stirling, com projetos pensados e resolvidos, sobretudo, com cortes e projeções isométricas, ao invés do racional método moderno da manipulação da planta. Esse método o tornou um arquiteto “didático” e, tal qual ele mesmo apresentava-se, “instintivo, direto e espontâneo”, indo contra a imagem intelectual dos profissionais de sua época (MONEO, 2008).

A “originalidade dentro da tradição” pontuada por um dos jurados do Pritzker Prize me 1981, demonstra o reconhecimento das passagens históricas e as raízes do trabalho de James Stirling, inspirado pelas construções de Liverpool, cidade em que cresceu e se formou.



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REFERÊNCIAS
BRITTO, F. Clássicos da Arquitetura: Neue Staatsgalerie / James Stirling e Michael Wilford. ArchDaily Brasil. 11 Fev 2012. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/29891/classicos-da-arquitetura-neue-staatsgalerie-james-stirling-e-michael-wilford>. Acesso em: 11 Mai 2018.

FAZIO, M.; MOFFET, M.; WODEHOUSE, L. A história da Arquitetura Mundial. Tradução técnica: Alexandre Salvaterra. 3. ed. Porto Alegre: AMGH, 2011.

FRACALOSI, I. Clássicos da Arquitetura: Florey Building / James Stirling. Título original: AD Classics: Florey Building / James Stirling. ArchDaily Brasil. 03 Jul 2013. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/108418/classicos-da-arquitetura-florey-building-slash-james-stirling>. Acesso em: 11 Mai 2018.

KROLL, A. AD Classics: Neue Staatsgalerie / James Stirling. ArchDaily. 03 Abr 2011. Disponível em: <https://www.archdaily.com/124725/ad-classics-neue-staatsgalerie-james-stirling/>. Acesso em: 10 Mai 2018.

MONEO, R. Inquietação teórica e estratégia projetual na obra de oito arquitetos contemporâneos. Título original: Inquietud teórica y estratégia projetual em la obra de ocho arquitectos contemporâneos. Trad.: Flávio Coddou. São Paulo: Cosac Naify, 2008.

PEREIRA, J. R. A. Introdução à história da Arquitetura: Das origens ao século XXI. Tradução técnica: Alexandre Salvaterra. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010.

RIBA ARCHITECTURE. About the Stirling Prize. Londres, Reino Unido 2017. Disponível em: <https://www.architecture.com/awards-and-competitions-landing-page/awards/riba-stirling-prize>. Acesso em: 15 Mai 2018.

THE HAYATT FOUNDATION. The Pritzker Architecture Prize: 1981 Lauriate. Madrid, Spain, 2018. Disponível em: < https://www.pritzkerprize.com/laureates/1981>. Acesso em: 15 Mai 2018.

TIETZ, J. História da arquitetura contemporânea. Editado H.F. Ullmann Tandem Verlag GmbH, Colônia: São Paulo, 2008.

VIDLER, A. James Frazer Stirling: notes from the archive. 1. ed. 303 p. New Haven: The Yale Center for Britsh Art, 2010.

WINTANLEY, T. Notes from the Archive: James Frazer Stirling. ArchDaily. 10 Jun 2012. Disponível em: <https://www.archdaily.com/242847/notes-from-the-archive-james-frazer-stirling/>. Acesso em: 10 Mai 2018.
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SE FOR CITAR, USE:
(ABNT)

MONTEIRO, Isabele Baptista; LOSS, Aline Regina. James Stirling: Estudo Biográfico. 2018. 5 f. Trabalho Acadêmico (Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Paulista, São José do Rio Preto - SP, 2018. Disponível em: <...>. Acesso em: xxxxx.
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Comentários

  1. Adorei as referências!!
    Desejo sucesso e que seu público possa usufruir muito desse blog que já foi tão meu...
    Beijos 🌺♥️

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